O artigo 225 da Constituição de 1988 define o meio ambiente como um “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações”, bem como defende que todos devem ter direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A fim de assegurar tal direito, o Poder público tem por dever cumprir algumas ações, tais quais proteger a fauna e a flora; preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais básicos; prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas e definir espaços territoriais a serem especialmente protegidos, cuja alteração e a supressão são permitidas somente através de lei.
Em comparação aos outros países, a legislação ambiental brasileira é considerada uma das mais completas e avançadas do mundo, muito embora ainda possua muitas lacunas. Elas surgiram a partir da necessidade de proteger o meio ambiente e reduzir ao mínimo as consequências de ações devastadoras. A fiscalização das leis é responsabilidade dos órgãos ambientais, que definem regulamentações e atos de infração em casos de não cumprimento e seu cumprimento é responsabilidade de empresas, entidades privadas e públicas e cada cidadão.
Histórico e construção das leis ambientais no Brasil
O surgimento das primeiras leis ambientais no Brasil é marcado por momentos históricos de forte pressão econômica, escassez de recursos naturais e necessidade de assegurar qualidade de vida humana, a produção de alimentos e energia. Da década de 30 até o início da década de 70, o processo quando o Brasil entrava na época do “milagre econômico”. Nesse período, ocorreu o primeiro choque do petróleo e as primeiras manifestações ambientalistas em várias partes do globo.
Em 1605, foi aprovado o Regimento Pau-Brasil, a primeira lei de caráter ambiental voltada à proteção e preservação das florestas brasileiras, cuja ênfase era frear a extração desenfreada do pau-Brasil (Caesalphinia echinata) de forte interesse comercial, de larga aplicação na marcenaria e produção de corantes. Seu descumprimento acarretava altas penas aos infratores.
No ano de 1797, a Carta Régia trouxe à tona a carência de proteção aos rios, nascentes e encostas, além de exigir a conservação de espécies florestais numa faixa de 10 léguas da costa e fiscalizar a atividade de exploração madeireira e da manutenção dos recursos de interesse da Coroa Portuguesa, principalmente as mais nobres, como o cedro e o mogno.
Em 1911 é expedido o Decreto nº 8.843, que cria a primeira reserva florestal do Brasil, no antigo Território do Acre e em 1916 surge o Código Civil Brasileiro, que lista várias disposições protetivas, sendo a maioria, voltada para interesses patrimoniais, de natureza individualista.
A partir da segunda metade da década de 90, atendendo às reivindicações de movimentos sociais e ambientais, outras leis foram promulgadas e muito embora tenham sofrido alterações, ainda estão vigentes na atualidade e constituem as principais leis ambientais.
Principais leis ambientais
1. Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938 – 1981)
Tem como objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental benéfica à vida, pretendendo garantir boas condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da qualidade da vida humana. Responsabiliza o Ministério Público por punir causadores de danos ao meio ambiente, impondo ao poluidor a obrigação de recuperar e/ou indenizar prejuízos causados e por fim define a obrigatoriedade dos estudos e respectivos relatórios de impacto ambiental como condição necessária ao licenciamento ambiental de qualquer obra/empreendimento/atividade.
2. Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605 – 1998)
Diz respeito às questões penais e administrativas referentes às ações nocivas ao meio ambiente, concedendo aos órgãos ambientais mecanismos para punição de infratores, como em caso de crimes ambientais praticados por organizações ou pessoa jurídica.
3. Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9.433 – 1997)
Define a água como recurso natural limitado, dotado de valor econômico, que pode ter usos múltiplos – consumo humano, produção de energia, transporte, lançamento de esgotos. A lei prevê também a criação do Sistema Nacional de Informação sobre Recursos Hídricos para a coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão.
4. Lei de Fauna (Lei 5.197 – 1967)
Esta Lei proporcionou medidas de proteção à fauna. Ela classifica como crime o uso, perseguição, captura de animais silvestres, caça profissional, comércio de espécies da fauna silvestre e produtos originários de sua caça, além de proibir a importação de espécie exótica e a caça amadora sem autorização do IBAMA. Criminaliza também a exportação de peles e couros de anfíbios e répteis.
5. Novo Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651 – 2012)
Revoga o Código Florestal Brasileiro de 1965 e desde a sua reformulação suscitou polêmica entre ruralistas e ambientalistas. Discorre acerca da proteção da vegetação nativa, determinando a responsabilidade do proprietário rural em delimitar e conservar a Área de Preservação Permanente (APP) e a Reserva Legal (RL) em suas propriedades a fim de preservar e proteger todos os ecossistemas.
6. Política Agrícola (Lei 8.171 – 1991)
Tem por objetivo a proteção do meio ambiente e estabelece a obrigação de recuperar os recursos naturais para as empresas que exploram economicamente águas represadas e para as concessionárias de energia elétrica. Define que o poder público deve disciplinar e fiscalizar o uso racional do solo, da água, da fauna e da flora; desenvolver programas de educação ambiental, fomentar a produção de mudas de espécies nativas, entre outros.
Contexto atual
A construção da legislação ambiental no Brasil e sua aplicabilidade não acontece de forma linear, pois é marcada por avanços e retrocessos, dado que sua implementação está diretamente vinculada às agendas dos governantes e de acordo com o grau de impactos causados pelos empreendimentos em determinados locais, isto é, nas áreas industriais, nas metrópoles ou em grandes monoculturas.
A última gestão do governo federal (Jair Bolsonaro, 2019-2022) se apresentou como forte ameaça às leis ambientais, haja vista inúmeras reduções, alterações e ações legais que juntas configuraram um desmonte que atendiam interesses da bancada ruralista, indústria agrícola. Em 2021, Bolsonaro alterou a Lei dos Agrotóxicos de 1989 para liberar e flexibilizar o registro de pesticidas que causam câncer; aprovou o Projeto de Lei (PL) 6299/2002 liberando o uso de mais de mil novos agrotóxicos, alterando o controle da autorização de novos agrotóxicos, excluindo o papel da Anvisa e do Ibama; aprovou o PL 191/2020 que regulamenta quase qualquer tipo de empreendimento em terras indígenas, como atividade de mineração, hidrelétricas e exploração de gás e o petróleo, autorizando a realização de estudos nestas terras com potencial exploratório sem ao menos consultar as comunidades que vivem nestas áreas.
Sem contar a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, PL 3729/2004, conhecida como "mãe das boiadas", também aprovada em 2021, que prevê a flexibilização do licenciamento para uma série de empreendimentos como rodovias, ferrovias e gasodutos e cria um processo de autolicenciamento para outros. A medida inclui a redução do papel dos órgãos ambientais na fiscalização e diminui as responsabilidades de empreendedores em projetos e obras potencialmente danosas ao meio ambiente.
A lista de retrocessos do governo Bolsonaro é vasta e aliada à distorção dos fatos, desinformação e negacionismo, muito presentes neste último governo, foi forte fator no enfraquecimento e desvalidação das leis ambientais. No entanto, a mudança de governo renova as esperanças dos movimentos sociais, ambientalistas e cientistas, na luta em assegurar o cumprimento das leis ambientais e sua reformulação, valendo salientar que a luta não pode parar por aqui.
Fontes:
Avelino, C. 2016. As sete principais leis ambientais brasileiras. Estratégia ODS. Disponível em: <https://www.estrategiaods.org.br/as-sete-principais-leis-ambientais-brasileiras/>. Acesso em 28 fev. 2023.
Brasil. 1988. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 28 fev. 2023.
Garvão, R. F. & Do Nascimento Baia, S. A. L. 2018. Legislação Ambiental: um histórico de desafios e conquistas para as políticas públicas brasileiras. Nova Revista Amazônica, 6(2), 93-102.
IBF – Instituto Brasileiro de Florestas. As Principais Leis Ambientais no Brasil. Disponível em: <https://www.ibflorestas.org.br/conteudo/leis-ambientais>. Acesso em 28 fev. 2023.
Silva, M. D. Da. 2023. O resgate ambiental do Estado brasileiro. Diário Popular. Disponível em: <https://diariopopular.com.br/opiniao/o_resgate_ambiental_do_estado_brasileiro__.428004>. Acesso em 28 fev. 2023.
Superior Tribunal de Justiça. 2010. Linha do tempo: um breve resumo da evolução da legislação ambiental no Brasil. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/noticias/2219914/linha-do-tempo-um-breve-resumo-da-evolucao-da-legislacao-ambiental-no-brasil>. Acesso em 28 fev. 2023.
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